terça-feira, 8 de maio de 2012

FAMÍLIA E DIVERSIDADE!


FAMÍLIA E DIVERSIDADE: OS NOVOS DESAFIOS PARA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

Para começar a falar um pouco sobre o tema acima, faço em primeiro lugar uma analogia a tudo que foi estudado sobre o assunto, abordando uma grande queixa escutada nos consultórios de psicologia: “Eu queria tanto ter uma família normal”. Filhos de pais separados sentem da ausência do pai (ou da mãe), mulheres sozinhas queixam-se que não conseguiram constituir famílias, e mulheres separadas acusam-se de não terem sido capazes de conservar as suas. São várias as queixas ouvidas, e todas partem da grande questão que a família não é mais a mesma. Visto que, a própria sofreu várias modificações ao longo do percurso existencial e, portanto, não é a mesma comparando o modelo de família idealizado, modelo que corresponde ás necessidades da sociedade burguesa emergente em meados do século XIX.
Na segunda metade do século XX a família hierárquica, que era organizada em torno do poder patriarcal, começou a ceder lugar a um modelo de família, onde o poder era distribuído de forma mais igualitária entre homem e mulher, e também entre pais e filhos. O pátrio poder foi abalado, visto que, a mulher passou a ter ingresso no mercado de trabalho, e não era mais tão dependente do chefe da família quanto às crianças geradas pelo casal. Com tudo isso, o número de separações e divórcios veio aumentando, assim como a idade em que as mulheres vêm decidindo se casar. O número de relações não legalizadas entre jovens também vêm crescendo, em função da sua independência financeira e também em condições de arriscar um pouco mais nas escolhas amorosas, quanto em função da liberdade sexual conquistada há quase meio século pelas mulheres. Isso nos ajuda a entender o tabu da virgindade, único freio capaz de fazer com que jovens adultas adiassem por tanto tempo o início de sua vida sexual á espera do casamento legal e definitivo. Posteriormente, veio à descoberta e democratização das técnicas anticoncepcionais, o tabu que sustentava o casamento monogâmico deixou de fazer sentido. Em decorrência, hoje, o número de mães solteiras e a gravidez não programada entre as adolescentes vêm aumentando cada vez mais.
Um exemplo das transformações que a família sofreu parte da Europa, nos séculos XVI, XVII e XIX, onde primeiramente a criança não era vista como sendo ser humano e seus cuidados eram destinados aos empregados, sendo os bebês amamentados pelas amas de leite (no caso das famílias que faziam parte da aristocracia), enquanto que nas famílias dos camponeses as crianças não eram dignas de atenção e seus cuidados geralmente eram divididos com os avôs ou com as moças solteiras. As relações familiares dessa época eram distantes, mas com o tempo as relações da família vão se tornando mais íntimas, privadas e com maior intensidade emocional, como afirma Vainer (1999).
            Nas configurações familiares novas formas de convívio vêm sendo improvisados em volta da necessidade que não se alterou de criar os filhos, frutos de uniões amorosas temporárias que nenhuma lei de Deus ou dos homens consegue mais obrigar a que se eternizem. A sociedade contemporânea conduzida por leis de mercado que lançam imperativos de bem-estar, prazer e satisfação de todos os desejos, só reconhece o amor e a realização sexual como fundamentos legítimos das uniões conjugais. Essa mudança moral proporciona a possibilidade de se tentar corrigir o próprio destino, que cobram seu preço em desamparo e mal-estar. O desamparo se faz sentir porque a família deixou de ser uma sólida instituição para se transformar num agrupamento circunstancial e precário, regida pela lei menos confiável entre os humanos: a lei dos afetos e dos impulsos sexuais. O mal-estar vem da divida que cobramos ao comparar a família que conseguimos improvisar com a que nos ofereceram nossos pais. Na verdade estamos em divida com o modelo de família burguesa, que as condições da sociedade contemporânea não permitem mais que se sustente a não ser á custa de grandes renúncias, e grande infelicidade para todos os seus membros. Esquecemo-nos que, família era aquela, e a que custo psíquico, sexual e emocional ela se manteve, durante um curto período de menos de dois séculos, como célula- mãe da sociedade.
Entendo por tudo isso que família é sistema de relações que se traduz em conceitos e preconceitos, ideias e ideais sonhos e realizações. É uma instituição que mexe com nossos mais caros sentimentos e que muda com a evolução da cultura, de geração para geração.
            A partir de todas essas transformações nas famílias, os laços conjugais já não escondem a base erótica. Os filhos deixaram de ser a finalidade, ou a consequência inevitável dos encontros eróticos. As separações e as novas uniões foram formando aos poucos um novo tipo de família que vamos chamar de família tentacular, diferente da família extensa pré-moderna e da família nuclear que vai aos poucos perdendo a superioridade. Após a segunda metade do século XX a família desprivatizou-se, porque o núcleo central da família contemporânea foi implodido, atravessado pelo contato íntimo com adultos, crianças e adolescentes vindas de outras famílias. Na confusa árvore genealógica da família tentacular, irmãos não-consanguineos convivem com padrastos ou madrastas, ás vezes já de uma segunda ou terceira união de um de seus pais, acumulando vínculos profundos com pessoas que não fazem parte do núcleo original de suas vidas.
            Elisabeth Roudinesco escreve: “a família é a formação de organização social mais persistente, mesmo levando em consideração diferenças históricas e culturais. A família que está em desordem, na expressão da autora é justamente a família nuclear contemporânea, herdeira da família vitoriana”. Sabemos que a família mudou, mudaram os papéis familiares, os homossexuais reivindicaram o casamento institucional, solteiros de ambos os sexos lutam pelo direito de adotar crianças e constituir uma família normal.
            Os papéis familiares tradicionais não são mais, necessariamente, desempenhados pelas pessoas que, na estrutura do parentesco, correspondem a pai, mãe e filhos. Se existir para a criança alguém que faça função paterna e alguém que se encarregue amorosamente dos cuidados maternais, a família estruturará edipicamente o sujeito. É dentro dessa estrutura chamada família que a criança vai se indagar sobre o desejo que a constituiu, o desejo do outro e vai se deparar com o enigma de seu próprio desejo.  O papel da família na modernidade é formador, o sentido de preparar a criança para suas responsabilidades em relação ás normas de convívio social. Os papéis dos agentes familiares são substituíveis, por isso chamados de papéis. O que é insubstituível é um olhar de adulto sobre a criança, a um só tempo amoroso e responsável, desejante que essa criança seja feliz na medida do possível.
Por fim, a família é considerada o núcleo básico de construção do eu. Como cita Lévi-Strauss (apud Roudinesco, 1994): “A família, ao repousar sobre a união mais ou menos duradoura e socialmente aprovada de um homem, de uma mulher e de seus filhos, é um fenômeno universal presente em todos os tipos de sociedade’’.

REFERENCIAS:

ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1981.

CERVENY, Ceneide Maria de Oliveira. Família em movimento. _São Paulo: Casa do Psicólogo, 2007.

GRONENGA e  PEREIRA. Direito de Família e Psicanálise, rumo a uma nova epistemologia. RJ, Imago 2003.

ROUDINESCO, Elisabeth. A família em desordem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. Ed. 2003.

Um comentário:

  1. Acabo de saber que a nomenclatura Pátrio Poder, foi substituída por Poder Familiar. Informações do ECA.

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